Não escrevo muito sobre a morte: na verdade ela é que escreve sobre nós – desde que nascemos vai elaborando o roteiro de nossa vida. Ela é a grande personagem, o olho que nos comtempla sem dormir, a voz que nos convoca e não queremos ouvir, mais pode nos revelar muitos segredos.
O maior deles talvez seja: a morte torna a vida maravilhosa. Porque vamos morrer precisamos poder dizer hoje que amamos, fazer hoje o que desejamos tanto, abraçar hoje o filho ou o amigo, temos de ser decentes hoje, generosos hoje, felizes hoje.
A morte não nos persegue: apenas espera, pois nós é que corremos para o colo dela. Talvez o melhor de tudo é que ela nos lembra da nossa transcendência. Somos mais que corpo e sangue e compromissos, susto e ansiedade: somos mistério, o que nos torna maiores do que pensamos ser.
E o amor, quando se aproxima desse território do estranho, tem de se curvar: com dor, com terror, com enorme ansiedade dá um salto irrevogável para essa prova maior. E então começa a ser ternura; e então se aproxima, muito vagamente, de alguma coisa chamada permanência.
Lya Luft: Secreta Mirada
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